Ex mo. Sr. Dr. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa
Processo nº134509/09
O Ministério Público, com sede na Rua da Escola Politécnica nº140, 1100-231 Lisboa vem requerer contra:
Estradas de Portugal S.A., (E.P.) pessoa colectiva nº9876543, com sede na Rua das Flores, nº3 2720 Amadora e Empresa Paisagens de Alcatrão S.A., pessoa colectiva nº 123456789, com sede na Rua Pedro Freitas nº 14, 1350 Lisboa, esta título de contra-interessada
Ao abrigo dos artigos 132º e 112º e seguintes do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante CPTA), PROVIDÊNCIA CONSERVATÓRIA RELATIVA A PROCEDIMENTO DE FORMAÇÃO DE CONTRATO, para suspensão das obras já iniciadas da auto-estrada A/5401 “Para Sítio Nenhum “, cuja concessão pertence à empresa Paisagens de Alcatrão.
I – Dos factos:
1º
Pela Resolução do Conselho de Ministros nº 000/08, de 13 de Janeiro de 2008, foi determinado que a E.P. lançasse, durante o primeiro trimestre desse ano, concurso público internacional para a concessão de “Sítio Nenhum”, em regime de parceria público – privada.
2º
3º
4º
Não foi entregue a exigível Declaração de Impacte Ambiental, prevista no programa do concurso no seu art. 26º nº1 al.b) e no art. 30º da Lei 81/87.
5º
A Paisagens de Alcatrão apresentou-se a concurso, chegando ao final da primeira fase de qualificação e avaliação de propostas com uma pontuação global de 11,06.
6º
Invocando razões económicas, a concessionária veio a alterar a sua proposta já na fase negociações, degradando as suas condições iniciais, havendo um acréscimo de 51,4 milhões de euros. Na sequência destas alterações a sua proposta desceu na pontuação, ficando com 06,9.
O art. 29º do programa do concurso estipula que não podem ser seleccionadas propostas na segunda fase que ofereçam condições menos vantajosas do que as apresentadas na primeira fase.
8º
A Paisagens de Alcatrão foi escolhida pela EP para a celebração do contrato de concessão, mediante acto de adjudicação, então notificado aos interessados.
10º
No ACÓRDÃO XXX/09 – 11.Dez, o Tribunal de contas, ao abrigo da competência conferida pelo artigo 5º/1 c) da Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal de Contas, recusou o visto prévio ao contrato em causa.
11º
As obras de construção da auto-estrada continuam, estando os seus custos avaliados em 10.004.006 € a suportar pela E.P.
II
Do Direito
12º
A falta de parecer e a violação das normas do programa do concurso geram anulabilidade nos termos do artigo 135º do Código de Procedimento Administrativo.
13º
A violação destas normas resulta claramente dos relatórios do concurso e dos termos do contrato e foi já declarada pelo tribunal de contas no Acórdão atrás citado.
14º
A recusa de visto prévio importa a invalidade do contrato, nos termos do artigo 45º/2 da LOPTC, conforme interpretação correctiva perfilhada pela mais douta doutrina (veja-se Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, 3ª edição, pp.414 e 415).
15º
Tendo em conta que o acto de adjudicação se encontra inserido num processo pré-contratual, o meio processual será um processo urgente de contencioso pré-contratual, previsto no art. 100º do CPTA.
16º
A providência cautelar em causa está estipulada no art. 132º do CPTA e é seu critério de procedência a ponderação entre os interesses em litígio, o balanço entre os danos resultantes da sua adopção e os danos resultantes da sua improcedência. É o critério da proporcionalidade, na vertente do equilíbrio.
17º
Importa nesta ponderação considerar, ainda que não a titulo autónomo, os critérios gerais do regime das providências cautelares : "fumus boni iuris" e "periculum in mora".
18º
A continuação das obras, até à decisão final a proferir em sede do processo principal, levará, ainda que seja declarada a invalidade do contrato e determinada a sua anulação, a que a EP se vejam forçada a suportar o custo dessas obras.
19º
Se com a anulação do contrato se pretende erradicar todos os efeitos jurídicos do contrato, desde a sua celebração, o facto de as obras já terem começado, impedirá que se erradiquem alguns efeitos de facto. Permitir que elas continuem será ampliar ainda mais esses efeitos e levar a que, por via de uma acção de enriquecimento sem causa, a concessionária, que ilegalmente ganhou o concurso, consiga efeitos semelhantes à celebração de um contrato de concessão válido.
20º
A produção destes efeitos põe em perigo não só o erário público, lesado por um contrato celebrado ilegalmente, mas também a transparência e imparcialidade em face de interesses privados que devem predominar nos procedimentos pré-contratuais e em qualquer relação jurídica administrativa.
21º
Permitir que a empresa concessionária venha a conseguir por outra via o que lhe estaria vedado na sequência da invalidade do contrato é premiar a violação de normas administrativas e minar a confiança que os cidadãos devem poder depositar na actuação da administração.
22º
Alegar-se-à que a paralisação das obras lesará o interesse das populações servidas pela auto-estrada em causa ao atrasar o seu desenvolvimento, nomeadamente económico.
23º
Ficará também lesado o interesse da concessionária vencedora que realizou os investimentos necessários para começar a obra.
24º
Não se entende, contudo, que a paralisação, que sempre será temporária, possa gerar danos superiores aos interesse por ela tutelados.
25º
Acrescido de que a acção principal corresponde a um processo urgente, com tramitação mais acelerada, idónea a proferir uma decisão definitiva num espaço de tempo mais curto.
26º
O Ministério Público tem legitimidade para requerer esta providência nos termos do art. 1º e 3º nº3 al. e) do seu Estatuto e 55º/b por remissão dos artigos 100º/1 e 132º/3 do CPTA.
27º
O requerimento da providência é tempestivo, nos termos do artigo 101º, por remissão do artigo 132º/3 CPTA, uma vez que ainda não decorreu um mês desde o momento em que o Ministério Público tomou conhecimento da adjudicação.
28º
O tribunal é competente em razão da matéria segundo o art. 1º e o art. 4º nº1 al. e) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e é competente territorialmente nos termos do artigo 16º CPTA e o meio processual é o idóneo. Também é competente para conhecer da providência segundo o art. 132º nº3 e 114º nº 2 do CPTA.
Os magistrados
Elisabete Martins dos Reis
Raquel Maurício
Maria Ana Fonseca
Luís Vasconcelos
Martinho Lucas Pires
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