quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Ministério Público - Turma 4

Simulação de Julgamento

Contencioso Administrativo

Aula prática de 16/12/09

Posição: Ministério Público

Âmbito de jurisdição: A jurisdição competente é a jurisdição administrativa nos termos do artigo 4.º, n.º 1, al. f) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

Legitimidade do Ministério Público: O Ministério Público, enquanto organismo estadual, a quem está cometida a tarefa de zelar, a título institucional, pela defesa da legalidade e do interesse público, nos termos do artigo 219.º, n.º 1 da CRP e artigo 1.º do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro, é, desde a reforma do Contencioso Administrativo de 2004, um ente com poderes alargados de intervenção no processo, tanto a nível de emissão de pareceres como (85.º/1 do CPTA) como enquanto autor (85.º, n.º1, última parte). Nos termos dos poderes que lhe competem enquanto sujeito processual, por via da acção pública e atentando o disposto no artigo 9.º , n.º 2 do Código de Processo dos Tribunais Administrativos, o MP tem legitimidade para intentar a presente acção administrativa (uma vez que a intervenção não foi solicitada pelas concessionárias concorrentes nos termos do artigo 85.º do CPTA).

Visto do Tribunal de Contas

O exercício da função administrativa pressupõe uma íntima ligação com o Tribunal de Contas (a eficácia e execução do contrato, que se insere numa relação jurídico-administrativa depende da concessão de um visto do TC). Qual o efeito jurídico da recusa do visto prévio do tribunal de contas relativamente aos contratos de empreitada e concessão da auto-estrada A/5401 “Para Sítio Nenhum”? Nos termos da Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas (Lei 98/97, de 26 de Agosto), com as alterações introduzidas pelas Leis 35/2007, de 13 de Agosto e 48/2006, de 29 de Agosto, a fiscalização prévia visa verificar se os actos e contratos estão conformes às leis em vigor e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria (artigo 44.º, n.º 1 LOPTC). Os actos e contratos, apesar de estarem sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas (artigo 46.º, n.º 1, al. b) da LOPTC) podem produzir os seus efeitos antes da emissão do visto (artigo 45.º). Assim sendo, a obra poderia começar sem emissão do visto prévio. No entanto, houve recusa de emissão de visto prévio por uma das razões do artigo 44.º, n.º 3, sendo que essa recusa leva à ineficácia jurídica deste contrato após a notificação (45.º, n.º 2). Além do mais, invoca a empresa construtora que a recusa de visto “apenas dificulta os pagamentos, não impedindo que as obras continuem a decorrer com toda a normalidade”. Na verdade, com base no disposto no artigo 45.º, n.º 3 da LOPTC, apenas poderá haver pagamento dos trabalhos realizados até à data da notificação da recusa do visto ainda que estes pagamentos sejam efectuados posteriormente.

Execução e cumprimento da sentença: Nos termos do artigo 65.º, n.º1, al. h) da LOPTC, o TC aplica multas pela execução de contratos a que tenha sido recusado o visto e, ainda, nos termos do artigo 66.º, n.º 1, alínea d), pode o Tribunal aplicar multas por colaboração injustificada com o Tribunal.

Para além disto, esta execução pode dar origem a um crime de desobediência por parte da concessionária, nos termos do artigo 348.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, de forma a assegurar o efeito útil da recusa do visto para aqueles que poderiam ter capacidade financeira para suportar o montante máximo das multas.

Acção Administrativa Comum

Conforme o disposto no artigos 40.º, n.º 1, al. b) do CPTA (legitimidade em acções relativas à validade de contratos), intenta-se uma acção administrativa comum, de simples apreciação, na forma de processo ordinário (artigos 42.º e 35.º do CPTA), para a declaração da invalidade dos contratos (artigo 37.º, n.º 2, al. h)). Os contratos de empreitada e concessão de obras públicas em causa é insusceptível de modificação e inválido. Em primeiro lugar, a empresa de construção “Paisagens de Alcatrão” alega uma modificação do preço estabelecido no contrato relativamente ao previamente estabelecido no caderno de encargos com base numa alteração superveniente de circunstâncias, nos termos do artigo 437.º do Código Civil, fundada na recente crise económica. Ora, de acordo com os requisitos deste artigo, a alteração das circunstâncias apenas poderá ser legitimamente invocada quando não se encontrar coberta pelos riscos próprios do contrato, o que manifestamente não se verifica, ou, sendo anormal, o que também não acontece. Até que ponto pode uma evolução de um ciclo económico e uma crise cujo início já data de 2006 ser invocada como motivo de alteração de uma proposta que ganhou um concurso público quando o prazo que medeia a apresentação do caderno de encargos à celebração e execução do contrato é visivelmente curto. Pelo disposto no artigo 437.º do Código Civil, a empresa construtora encontra-se impedida de modificar o contrato e, por violação do caderno de encargos com o qual foi eleita a melhor proposta, o contrato é inválido por violação dos artigos 284.º, n.º 1 e 2, 286.º, e 287.º, n.º 1 do Código dos Contratos Públicos (violação dos princípios da boa fé, e da concorrência), sem desconsiderar os restantes vícios assinalados pelo Tribunal de Contas.

Alem do mais, a título subsidiário, intenta-se ainda acção comum de condenação para condenação à abstenção de comportamentos (artigo 37.º, n.º 2, alínea c) do CPTA), com legitimidade de novo pelo artigo 9.º, n.º 2 do CPTA.

Tratando-se de uma acção administrativa comum, esta pode ser proposta a todo o tempo, nos termos do artigo 41.º, n.º 1 do CPTA. Ainda que se entenda que a consequência da invalidade é a anulabilidade, e aí o prazo seria de 6 meses (artigo 41.º, n.º 2 do CPTA), que ainda não decorreu no que toca ao conhecimento do clausulado por parte do Ministério Público.

Providência Cautelar:

Em anexo, junta-se requerimento para decretação concomitante de uma providência cautelar conservatória (manutenção do status quo ex ante), com o momento e forma de pedido previstos no artigo 114.º do CPTA, para suspensão imediata das obras da auto-estrada A/5401. Nos termos do artigo 112.º visa-se assegurar a utilidade da sentença a proferir quanto ao pedido principal acima formulado, uma vez que se a providência não for adoptada imediatamente, corre-se o risco da verificação do facto consumado e da irreversibilidade do dano. Assim sendo, nos termos do artigo 112.º, n.º 2, al. f) vem-se requerer a intimação do Instituto das Estradas de Portugal e da empresa construtora “Paisagens de Alcatrão” para abstenção de conduta, por fundado receio de violação de normas de direito administrativo (Código dos Contratos Públicos – artigos 284.º/1, 286.º e 287.º).

Quanto aos pressupostos para a decretação da providência cautelar, conclui-se que há a verificação de todos na presente situação. Em primeiro lugar, verifica-se o pressuposto comum do periculum in mora, uma vez que há fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado que se traduz na conclusão das obras em questão.

Verifica-se, igualmente, nos termos do artigo 120.º, n.º 1, al. b), parte final, o chamado fumus boni juris negativus ou fumus non malus juris, o que significa que a falta de fundamento da pretensão não é manifesta, uma vez que já se demonstrou a invalidade do contrato em questão e o próprio Tribunal de Contas recusou o visto com base em vícios materiais e formais do contrato. É mais do que aparente que há razão na presente demanda.

Por fim, no que respeita ao último pressuposto, a proporcionalidade na vertente do equilíbrio (artigo 120.º, n.º 2 do CPTA), na ponderação de uma relação custo/benefício, verifica-se uma preponderância do interesse público (defesa da legalidade em virtude de o contrato ser inválido por violação do CCP, defesa dos contra-interessados tendo em conta a violação do princípio da boa fé e da concorrência por violação do caderno de encargos na celebração do contrato de concessão e defesa da legalidade de afectação de despesas públicas dos contribuintes) sobre o interesse da empresa construtora e do Instituto das Estradas de Portugal (continuação de uma obra com recusa de visto de Tribunal de Contas, autonomia privada e alteração discricionária dos montantes da proposta dos cadernos de encargos).

As Procuradoras

Alexandrina Melancia (140106074)

Dearbháile Banahan (140106061)

Inês Barroso (140106119)

Joana Gomes (140106001)

Petra Carreira (140106122)

Rita Cruz (140106527)

Paisagens de Alcatrão - Turma 2

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito do
Tribunal Administrativo do Círculo de “Sitio Nenhum”

Processo 100706/09

Empresa Paisagens de Alcatrão S.A., pessoa colectiva nº 123456789, com sede na Rua Pedro Freitas nº 14, 1350 Lisboa, de acordo com os art. 117º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, vem apresentar a oposição à acção cautelar de suspensão imediata das obras da auto-estrada A/5401, requerida pela empresa Auto-Betão.



I – Factos


Pela resolução do Conselho de Ministros foi determinado que EP . lançasse concurso público internacional para a concessão da Auto Estrada A/ 5401.


Apresentaram-se 20 concorrentes ao concurso público lançado no dia 16 de Fevereiro de 2008, sendo apenas dois qualificados para a 2ª fase: “ “Paisagens de Alcatrão” e “Auto Betão”.


Foi escolhida a proposta apresentada pela empresa “Paisagens de Alcatrão”, que celebrou um contrato com a EP referente à concepção e concessão da auto-estrada A/5401 “ Para sitio nenhum”.


A concepção e construção do troço previsto entre “Algures em Portugal” e “Para sitio nenhum” tem a extensão de 25km. As obras já tiveram início e estão a decorrer no percurso de 10km.


O Tribunal de Contas não concedeu o visto prévio e considerou os contratos de empreitada e concessão da A/5401 inválidos, com fundamento em vícios de ordem formal e material.

II – Direito


A fiscalização prévia tem por fim verificar se os actos e contratos estão conforme às leis em vigor e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria, nos termos do art.44º da Lei da Organização e Processo do Tribunal de Contas, LOPTC. Por conseguinte o visto favorável é condição exigível para que haja lugar a pagamentos.


Mas a falta de visto prévio não terá efeitos imediatos e os actos e contratos sujeitos a fiscalização prévia do Tribunal de Contas podem produzir efeitos antes da emissão do visto, nos termos do art.45º da LOPTC.


A recusa do visto não impede por isso o inicio das obras.


O Tribunal de Contas fundamentou também a sua decisão na celebração do contrato com a EP referente à concepção e concessão da auto-estrada A/5401 “ Para sitio nenhum”. A empresa “Paisagens de Alcatrão”alterou a proposta com que foi seleccionada para a fase de negociação por motivos relacionados com a deterioração das condições financeiras do mercado e as alterações introduzidas pela concedente e que fizeram encarecer as concessões.

10º
O contrato de concessão contem a originalidade de prever que a empresa “Paisagens de Alcatrão”não pode reclamar à EP nenhum pagamento nos primeiros cinco anos da adjudicação da concessão.

11º
Ainda no que diz respeito à alteração das circunstâncias, o regime do art. 198º do Decreto –Lei 59/99 prevê que “Quando as circunstâncias em que as partes hajam fundado a decisão de contratar sofram alteração anormal e imprevisível de que resulte grave aumento de encargos na execução da obra que não cabe nos riscos normais, o empreiteiro terá direito à revisão do contrato para o efeito de, conforme a equidade, ser compensado do aumento de encargos efectivamente sofridos ou se proceder a actualização dos preços”

12º
Ainda não decorreu o período de apreciação, que pode dar lugar a recurso. Recurso esse que a EP anunciou pretender fazer.

13º
“Paisagens de Alcatrão” considera que a providência cautelar requerida nos termos do art. 112º e art. 120ª nº1 do CPTA é improcedente, uma vez que o requisito periculum in mora não se verifica já que a continuação das obras não provoca prejuízos de difícil reparação para os interesses que a “Auto Betão” visa assegurar.

14º
Assim sendo, tratando-se de requisitos cumulativos a falta de um deles afasta a procedência da providência cautelar.

15º
A empresa “Paisagens de Alcatrão” considera haver falta de fundamento na pretensão da “ Auto Betão” para a suspensão imediata das obras em curso já que provocariam prejuízos mais gravosos do que os que resultariam na improcedência da providência cautelar.

III – Danos

16º
Para a construção do troço previsto entre “Algures em Portugal” e “Para sítio nenhum”a empresa “Paisagens de Alcatrão” declinou propostas de outros empreendimentos.

17º
Se o pedido para a suspensão imediata das obras da auto-estrada A/5401 for considerado procedente irá causar prejuízos na ordem de “ muitos milhares de euros”.

18º
Os prejuízos estão relacionados com a realização dos investimentos necessários para começar a obra, com os contratos de fornecimento de materiais de construção, com a necessária suspensão dos contratos de trabalho e com as consequências a nível orçamental.

19º
O atraso na construção terá ainda despesas de manutenção e fiscalização da obra parada assim como o consequente atraso na finalização da auto-estrada A/5401 repercutindo-se no próprio interesse público, nos termos do art 266 nº1 da Constituição da República Portuguesa.

IV- Conclusão

20º
A empresa “Paisagens de Alcatrão” considera pelos motivos já mencionados, que a falta do visto prévio não impede que as obras continuem a decorrer com toda a normalidade, uma vez que está pendente de recurso.


Ana Filipa Tavares
Sofia Sousa Rodrigues

PETIÇÃO INICIAL DA EMPRESA CIMENTO & MADEIRA, S.A. – Turma 2

Exmo. Sr. Juíz de Direito

Do Tribunal Administrativo de Círculo de Sítio Nenhum

A Sociedade Construtora Cimento & Madeira, S.A., pessoa colectiva nº 189563100 com sede na Praça Caos Calmo, nº58, sita em Algum Sítio, de ora em diante designada por Autora, e neste acto representada pelas advogadas da “Sociedade Freud, Kakfa & Associados”, com domicílio profissional na Avenida dos Tira-Teimas, nº 10, onde recebe notificações e intimações,

vem, respeitosamente, nos termos dos arts 2º, 2 e 3º CPTA e art. 4º, 1 e) e f) ETAF, instaurar contra

Instituto das Estradas de Portugal, S.A., de ora em diante designado por IEP

e

Empresa Paisagens de Alcatrão, S.A., de ora em diante designada por EPA

Acção de Impugnação do Acto de Adjudicação do Contrato de Concessão e Empreitada da auto-estrada A/501 e Acção de Anulação do mesmo Contrato de Concessão e Empreitada, com estas se pretendendo, ainda, cumular Acção de Responsabilidade Civil Extra-Contratual contra o IEP;

Por esta via, apresenta-se, também, Requerimento de Providência Cautelar Conservatória, com vista à suspensão da eficácia do supramencionado contrato;

o que faz nos termos e pelos fundamentos seguintes:

I – DOS FACTOS

Em Fevereiro de 2008, o IEP lançou um concurso público com vista à construção da auto-estrada A/501 “Para Sítio Nenhum”.

À data da sua publicação foi apresentado o Programa de Concurso, compreendendo os critérios de ingresso e as características do processo de selecção do concessionário, assim como o respectivo Caderno de Encargos.

Apresentaram-se a concurso 20 concorrentes, nomeadamente a Autora – descrita como “concorrente nº 5” no Acórdão do Tribunal de Contas, p.16, que se junta em anexo - e Paisagens de Alcatrão, S.A.

O procedimento de selecção decorreu em duas fases, sendo a primeira de qualificação e avaliação das propostas e a segunda de negociações, nesta procurando-se melhorar as duas propostas na fase anterior seleccionadas e escolher, então, a Subconcessionária.

A empresa Paisagens de Alcatrão venceu o concurso público em causa com a classificação final, na 2ª fase, de 6,9, esta classificação final inferior à de 11,5 obtida pela autora na 1ª fase.

No dia 26 de Novembro de 2009, foi celebrado contrato público de empreitada e concessão da auto-estrada A/501 entre o IEP e a EPA.

No dia 7 de Dezembro de 2009, o Tribunal de Contas, no âmbito da sua competência de fiscalização prévia, considerou inválido tal contrato, assim recusando o respectivo visto prévio para início de obra.

Não obstante esta recusa, o IEP e o EPA não suspenderam as obras em curso, considerando não ter a decisão do Tribunal “qualquer alcance prático, pois apenas dificulta pagamentos, não impedindo que as obras continuem a decorrer com toda a normalidade”.

II – DO DIREITO

A Autora tem legitimidade activa, de acordo com os arts 9º,1 e 55º, 1 a) CPTA, a este propósito se ponderando a cumulação de pedidos que neste processo se opera e o cariz residual da acção administrativa especial face ao contencioso pré-contratual urgente, arts 100º, 1 in fine e 46º,3 CPTA.

10º

A IEP e a EPA têm legitimidade passiva plural, assim dispondo o art 10º, 1 e 7 CPTA.

11º

O acto de adjudicação em causa é impugnável, ao constituir uma decisão materialmente administrativa proferida por uma empresa pública – IEP -, tal nos termos do art 51º, 1 CPTA.

12º

De facto, o acto de adjudicação em causa e o seu respectivo processo de formação devem ser tido como inválidos, na medida em que foi, nomeadamente, violado o Programa do Concurso, no seu ponto 29, este dispondo que “o resultado das negociações não pode resultar na adjudicação de uma proposta, dos concorrentes que passaram à fase das negociações, em condições globalmente menos vantajosas para a EP do que as inicialmente propostas por aqueles mesmos concorrentes”, o que não se veio a verificar, tendo a EPA obtido nesta 2ª fase pontuação inferior à obtida pela Autora na 1ª fase. Ora, a natureza regulamentar deste documento, não raras vezes assinalada pelo Tribunal de Contas, implica que as suas disposições se devem manter estáveis durante o decurso dos respectivos procedimentos. Nestes termos, está, então, aqui em causa uma violação flagrante e ostensiva do Programa Do Concurso, colocando-se, assim, nomeadamente, em causa os princípios da estabilidade, da livre concorrência e da imparcialidade, isto para além de se estar perante um inegável agravamento do resultado financeiro do contrato celebrado, em tudo contrário, nos termos do art. 101º CRP, ao superior interesse público.

13º

O acto de adjudicação é, pois, anulável, articulando-se os artigos já elencados com os arts 135º CPA e 133º, a contrario, CPA e com o art 284º, 1 do Código dos Contratos Públicos.

14º

Essa impugnação deve ocorrer tendo em conta o contencioso pré-contratual urgente, previsto nos arts 100º ss CPTA. Transpondo para o ordenamento interno as Directivas Comunitárias nº 89/665/CEE, de 21 de Dezembro e nº 92/13/CEE, de 25 de Fevereiro, cria este regime condições para uma mais rápida solução dos litígios surgidos nos procedimentos pré-contratuais relativos a certos contratos, estes mencionados no art 100º, 1, entre os quais o contrato de empreitada de concessão de obras públicas. Trata-se, com efeito, de consagrar, tal como refere o Prof. Pedro Gonçalves 1, uma solução que, em tempo útil, viabilize a obtenção de uma decisão judicial de mérito que permita articular o interesse substancial dos concorrentes em contratar com a Administração com o interesse desta no andamento normal e célere do procedimento pré-contratual.

Acrescente-se que, sempre que está em causa a impugnação de actos administrativos relativos à formação de contratos constantes do referido art 100º,1, a adopção de processo urgente corresponde a um ónus.

15º

Quanto à tempestividade, é a presente acção proposta ainda não tendo decorrido um mês sobre a data em que a Autora foi notificada acerca do acto de adjudicação. Está, pois, preenchido, de acordo com o art 101º, o requisito da oportunidade no que toca a este processo urgente.

16º

Tendo em conta o art 47º, 2 c) CPTA (aqui invocado dado o supra-referido cariz residual da acção administrativa especial relativamente ao contencioso pré-contratual urgente), o contrato de concessão de obras públicas celebrado entre o IEP e a EPA é derivadamente inválido, ao resultar esta invalidade dos já apontados vícios de que padecem actos prévios, praticados no procedimento pré-contratual que precede a celebração do contrato.

17º

Nos termos do art 37º, 2 h), à acção de impugnação do contrato de concessão corresponderia acção administrativa comum (não se aplicando, aqui, os arts 102º, 4 e 63º, 2 CPTA na medida em que esta acção é interposta já depois de celebrado o contrato em causa 2). No entanto, estando em causa a cumulação com contencioso pré-contratual urgente, deverá ser outra a forma adoptada, como mais abaixo se descreve.

18º

No que toca à responsabilização do IEP pelos comportamentos lesivos adoptados durante o procedimento pré-contratual, ao verificar-se uma exclusão e adjudicação ilegal, pede a Autora indemnização no valor de X euros de forma a ser ressarcida da perda de oportunidade 3, encontrando-se preenchidos os requisitos dos quais a atribuição daquela depende. Vejam-se os arts 37º, 2 f) e 47º,1 CPTA e o art 4º, 1 g) ETAF, assim como a Lei 67/2007, de 31 Dezembro.

19º

No que toca à forma de processo a seguir, a responsabilização do IEP encontra-se consagrada no CPTA no âmbito da acção administrativa comum. Não obstante, também aqui será de introduzir alterações em função da cumulação de pedidos.

20º

No que diz , então, respeito à cumulação do contencioso pré-contratual urgente com a acção comum de impugnação do contrato e com a acção comum de responsabilidade civil, esta operar-se-á tendo em consideração os arts 100º, 1 in fine e 5º CPTA. O processo segue, portanto, enquanto acção administrativa especial, “com as adaptações que se revelem necessárias”, tendo-se em conta na sua tramitação uma articulação entre o regime do processo urgente e o regime da acção especial 4.

21º

Quanto à providência cautelar conservatória que segue em apenso, destinada a manter o status quo ex ante, conjugando os arts. 112º, 1 e 2, f), 120º, 1 b) e 128º CPTA encontra-se justificada a sua requisição, estando, designadamente, preenchidos os requisitos do periculum in mora, fumus boni iuris e proporcionalidade, aqui na vertente equilíbrio custo-benefício.

22º

Existe periculum in mora, aqui na sua vertente negativa, na medida em que “não [é] manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada” pela Requerente no processo principal, existindo, pelo contrário, fortes indícios de que a suspensão imediata da eficácia do contrato é necessária para impedir situações lesivas que, de outro modo, poderão resultar da mora do processo, como seja, a impossibilidade de à Requerente vir a ser adjudicado, eventualmente, por via de repetição de concurso, o contrato de concessão e empreitada da A/501.

23º

Verifica-se a existência de fumus boni iuris, ou seja, uma perspectiva de êxito por parte da Requerente no processo principal, tendo em conta todos os fundamentos de facto e de direito anteriormente expostos.

24º

Quanto à verificação do requisito da proporcionalidade, há que somar à invalidade derivada do contrato, o facto de se estar perante um agravamento flagrante e ostensivo do resultado financeiro do contrato celebrado, em tudo contrário, nos termos do art. 101º CRP, ao superior interesse público, tal como já mencionado no artigo 11º desta petição. Então, tendo tal presente, e sob pena de o interesse da Administração sempre sobrestar ao interesse do particular, aqui a Requerente, há que ter em conta a linha doutrinária e jurisprudencial que se tem vindo a mostrar consensual no sentido de que, só não haverá proporcionalidade, no caso de da não realização atempada do objecto do contrato decorrer um “estado de necessidade administrativo”. Efectivamente, esta é a interpretação que se mostra mais conforme à Constituição, só assim se operando a tutela jurisdicional efectiva garantida pelo art 268º, 4 da Lei Fundamental. Então, não se perspectivando como da aprovação da providência poderia resultar aquele “estado de necessidade”, há, aqui, portanto, proporcionalidade.

III – DO PEDIDO

25º

Nestes termos, e demais de direito aplicáveis, deve a acção ser julgada procedente e, consequentemente, serem o IPA e a EPA, condenados nos pedidos aqui apresentados.

Valor: Y euros

Juntam-se: três documentos, providência cautelar, procuração, cópia e duplicados legais.

As Advogadas,

Filipa Cid Galveias

Joana Andrade

Joana Barreto

Mara Franco

Algum Sítio, 16 de Dezembro de 2009

1 in Cadernos de Justiça Administrativa, p. 3 ss, nº 44, 2004

2 veja-se Acórdão TCA Sul, 10.09.2009, P. 05305/09

3 veja-se o Acordão TCA Norte, 9.11.2006

4 tal como propõe a Prof.ª Maria João Estorninho, in Direito Europeu dos Contratos Públicos, p.400 ss

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Providência Cautelar requerida pelo Ministério Público - Turma 2

Ex mo. Sr. Dr. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa

Processo nº134509/09

O Ministério Público, com sede na Rua da Escola Politécnica nº140, 1100-231 Lisboa vem requerer contra:

Estradas de Portugal S.A., (E.P.) pessoa colectiva nº9876543, com sede na Rua das Flores, nº3 2720 Amadora e Empresa Paisagens de Alcatrão S.A., pessoa colectiva nº 123456789, com sede na Rua Pedro Freitas nº 14, 1350 Lisboa, esta título de contra-interessada

Ao abrigo dos artigos 132º e 112º e seguintes do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (doravante CPTA), PROVIDÊNCIA CONSERVATÓRIA RELATIVA A PROCEDIMENTO DE FORMAÇÃO DE CONTRATO, para suspensão das obras já iniciadas da auto-estrada A/5401 “Para Sítio Nenhum “, cuja concessão pertence à empresa Paisagens de Alcatrão.

I – Dos factos:

Pela Resolução do Conselho de Ministros nº 000/08, de 13 de Janeiro de 2008, foi determinado que a E.P. lançasse, durante o primeiro trimestre desse ano, concurso público internacional para a concessão de “Sítio Nenhum”, em regime de parceria público – privada.

Em cumprimento desta resolução, a E.P. publicou, nos termos do artigo 130º do Código dos Contratos Públicos o anúncio do concurso e o respectivo programa.

Não foram pedidos estudos, relativos às vantagens do modelo de parceria publico-privada, exigidos pelo Decreto-lei nº141/2006 que estabelece o Regime Jurídico das Parecerias Público-privadas, no seu art. 6º nº1 al. a) e al. d).

Não foi entregue a exigível Declaração de Impacte Ambiental, prevista no programa do concurso no seu art. 26º nº1 al.b) e no art. 30º da Lei 81/87.

A Paisagens de Alcatrão apresentou-se a concurso, chegando ao final da primeira fase de qualificação e avaliação de propostas com uma pontuação global de 11,06.

Invocando razões económicas, a concessionária veio a alterar a sua proposta já na fase negociações, degradando as suas condições iniciais, havendo um acréscimo de 51,4 milhões de euros. Na sequência destas alterações a sua proposta desceu na pontuação, ficando com 06,9.

O art. 29º do programa do concurso estipula que não podem ser seleccionadas propostas na segunda fase que ofereçam condições menos vantajosas do que as apresentadas na primeira fase.

A Paisagens de Alcatrão foi escolhida pela EP para a celebração do contrato de concessão, mediante acto de adjudicação, então notificado aos interessados.

10º

No ACÓRDÃO XXX/09 – 11.Dez, o Tribunal de contas, ao abrigo da competência conferida pelo artigo 5º/1 c) da Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal de Contas, recusou o visto prévio ao contrato em causa.

11º

As obras de construção da auto-estrada continuam, estando os seus custos avaliados em 10.004.006 € a suportar pela E.P.

II

Do Direito

12º

A falta de parecer e a violação das normas do programa do concurso geram anulabilidade nos termos do artigo 135º do Código de Procedimento Administrativo.

13º

A violação destas normas resulta claramente dos relatórios do concurso e dos termos do contrato e foi já declarada pelo tribunal de contas no Acórdão atrás citado.

14º


A recusa de visto prévio importa a invalidade do contrato, nos termos do artigo 45º/2 da LOPTC, conforme interpretação correctiva perfilhada pela mais douta doutrina (veja-se Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, 3ª edição, pp.414 e 415).

15º

Tendo em conta que o acto de adjudicação se encontra inserido num processo pré-contratual, o meio processual será um processo urgente de contencioso pré-contratual, previsto no art. 100º do CPTA.

16º

A providência cautelar em causa está estipulada no art. 132º do CPTA e é seu critério de procedência a ponderação entre os interesses em litígio, o balanço entre os danos resultantes da sua adopção e os danos resultantes da sua improcedência. É o critério da proporcionalidade, na vertente do equilíbrio.

17º

Importa nesta ponderação considerar, ainda que não a titulo autónomo, os critérios gerais do regime das providências cautelares : "fumus boni iuris" e "periculum in mora".

18º

A continuação das obras, até à decisão final a proferir em sede do processo principal, levará, ainda que seja declarada a invalidade do contrato e determinada a sua anulação, a que a EP se vejam forçada a suportar o custo dessas obras.

19º

Se com a anulação do contrato se pretende erradicar todos os efeitos jurídicos do contrato, desde a sua celebração, o facto de as obras já terem começado, impedirá que se erradiquem alguns efeitos de facto. Permitir que elas continuem será ampliar ainda mais esses efeitos e levar a que, por via de uma acção de enriquecimento sem causa, a concessionária, que ilegalmente ganhou o concurso, consiga efeitos semelhantes à celebração de um contrato de concessão válido.

20º

A produção destes efeitos põe em perigo não só o erário público, lesado por um contrato celebrado ilegalmente, mas também a transparência e imparcialidade em face de interesses privados que devem predominar nos procedimentos pré-contratuais e em qualquer relação jurídica administrativa.

21º

Permitir que a empresa concessionária venha a conseguir por outra via o que lhe estaria vedado na sequência da invalidade do contrato é premiar a violação de normas administrativas e minar a confiança que os cidadãos devem poder depositar na actuação da administração.

22º

Alegar-se-à que a paralisação das obras lesará o interesse das populações servidas pela auto-estrada em causa ao atrasar o seu desenvolvimento, nomeadamente económico.

23º

Ficará também lesado o interesse da concessionária vencedora que realizou os investimentos necessários para começar a obra.

24º

Não se entende, contudo, que a paralisação, que sempre será temporária, possa gerar danos superiores aos interesse por ela tutelados.

25º

Acrescido de que a acção principal corresponde a um processo urgente, com tramitação mais acelerada, idónea a proferir uma decisão definitiva num espaço de tempo mais curto.

26º

O Ministério Público tem legitimidade para requerer esta providência nos termos do art. 1º e 3º nº3 al. e) do seu Estatuto e 55º/b por remissão dos artigos 100º/1 e 132º/3 do CPTA.

27º

O requerimento da providência é tempestivo, nos termos do artigo 101º, por remissão do artigo 132º/3 CPTA, uma vez que ainda não decorreu um mês desde o momento em que o Ministério Público tomou conhecimento da adjudicação.

28º

O tribunal é competente em razão da matéria segundo o art. 1º e o art. 4º nº1 al. e) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e é competente territorialmente nos termos do artigo 16º CPTA e o meio processual é o idóneo. Também é competente para conhecer da providência segundo o art. 132º nº3 e 114º nº 2 do CPTA.

Os magistrados

Elisabete Martins dos Reis

Raquel Maurício

Maria Ana Fonseca

Luís Vasconcelos

Martinho Lucas Pires

Resposta ao Eventual Recurso - T1

Acórdão Nº XXX/09 – 17.DEZ – Plenário da 1ª Secção

Processo Nº XXX/09

  1. A “Estradas de Portugal, SA” vem interpor recurso a este tribunal, na sequência da decisão do acórdão anterior, no qual, em sede de fiscalização prévia, se recusou o visto do contrato de subconcessão relativo à concepção, construção, aumento do número de vias, beneficiação, financiamento, exploração e conservação de diversos lanços de auto-estrada e de vias, genericamente designada por SUBCONCESSÃO DA AUTO-ESTRADA PARA SÍTIO NENHUM, celebrado entre aquela e a empresa construtora Paisagens de Alcatrão.

  1. DOS FACTOS

a) São dados como provados os mesmos factos do Acórdão recorrido.

  1. DO DIREITO

1.Não colhe o argumento de aplicação do artigo 99º do Código dos Contratos Públicos porquanto a matéria em apreço se refere à alteração das regras concursais da 1ª para a 2ª fase e não quanto ao conteúdo dos contratos celebrados com a concessionária.

2.Também não é admissível a aplicação do Decreto-Lei 55/99, uma vez que o mesmo foi integralmente revogado pelo Decreto-Lei 18/2008, de 29 de Janeiro, no seu artigo 14º, nº 1, alínea d).

3.Não pode ter acolhimento o entendimento de que o artigo 5º do Regime das Parcerias Público-Privadas estabelece um princípio imperativo de repartição de riscos no sentido de ambas as partes deverem suportar de forma equilibrada os riscos decorrentes de uma parceria. Uma melhor leitura do artigo 5º conjugado, quanto ao risco, com o artigo 7º vai no sentido de que o risco em situação de força maior deve ser, tanto quanto possível, transferido para o parceiro privado (artigo 7º, d), in fine do Decreto-Lei 86/2003, de 26 de Abril). O que o artigo 5º pretende é uma repartição de responsabilidades, determinando que preferencialmente cabe ao parceiro público o acompanhamento e o controlo de execução do objecto da parceria e ao parceiro privado cabe o financiamento, o exercício e a gestão da actividade contratada.

4.Não fica provado que a alteração na conjuntura financeira global produzisse um efeito de aumento proporcional nas propostas apresentadas na 1ª fase do concurso por forma a manter em situação de igualdade todas as empresas concorrentes, pois a simples enunciação desta suposição por parte das “Estradas de Portugal, SA” não prova o seu conteúdo. “Quem alega os factos tem que os provar.

5.Tratando-se da gestão de dinheiros públicos, não basta dizer que há um prazo melhor. Há que traduzir, por um lado, a eficiência desse prazo num valor económico e, por outro lado, justificar o aumento da despesa e assegurar que essa mesma despesa tem cabimento orçamental, sob pena de se colocar em causa o interesse público.

6.Na discussão do interesse público não se deve ir ao extremo de uma posição objectivista, nem ao de uma posição subjectivista, nem se poderá pôr em causa a legalidade.

7.O que está em causa é a violação do princípio da legalidade, desde logo o princípio da estabilidade do Procedimento Concursal, de onde resultaria afectado o princípio da imparcialidade, da transparência, da igualdade e da tutela dos direitos e interesses legítimos dos particulares.


  1. CONCLUSÕES

- Não se aplica o artigo 48º da LOPTC, uma vez que o valor dos contratos excede o valor fixado na Lei do Orçamento.

- A fiscalização prévia não se prende apenas com a necessidade de aferição da despesa face ao cabimento orçamental, mas também com o controlo das responsabilidades financeiras assumidas.


  1. DECISÃO

Por tudo quanto ficou exposto acordam os juízes em Plenário da Primeira Secção do Tribunal de Contas negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar integralmente o acórdão recorrido.


Notifique,

Lisboa, 17 de Dezembro de 2009

As Juízas Conselheiras,

(Ana Sardinha Festas – Relatora)

(I Sut Ho)

(Melanie Pereira)

(Paula Souto)

(Vanessa Rodrigues)

Voto de Vencido

Voto de Vencido:

Votei vencido no segmento do acórdão que recusou o visto às “Estradas de Portugal, SA”, doravante designada por EP.

Afigura-se-me que a solução por mim proposta – e que saiu vencida nesse segmento – se impunha de direito e de justiça:

Apesar de não se aplicar o instituto da alteração das circunstâncias, na medida em que não se trata de um problema colocado numa fase em que o contrato estivesse em execução, não deixa de ser relevante considerar a existência de deveres de protecção in contrahendo (cfr. António Menezes Cordeiro, Contratos Públicos - ..., Cadernos O Direito, Almedina, 2007).

O âmbito desta protecção in contrahendo refere-se à fase pré-contratual. Não estamos, portanto, em presença de um contrato em execução, mas sim de uma questão de afectação em concreto de circunstâncias fácticas excepcionais numa qualquer entidade, associada de alguma forma à Administração, com impacto na prossecução de fins de interesse público.

As “circunstâncias fácticas excepcionais” consubstanciam um conceito indeterminado que carece de preenchimento no caso concreto. In casu, como alegado pela EP, entre a 1ª e a 2ª Fase do Procedimento verificou-se uma acentuada degradação da conjuntura económico-financeira que se repercutiu directamente na esfera jurídica dos subconcessionários, alterando significativamente o valor dos termos e condições de financiamento.

Em suma, entendemos ser devido provimento de visto aos contratos de adjudicação apresentados pelas “Estradas de Portugal, SA”.

O Do Contra




Autor Empresa Concorrente - Petição Inicial

Francisco Esperto, Presidente do Conselho de Administração da construtora “Auto Betão”, de forma a assegurar o cumprimento da sentença do Tribunal de Contas, por parte do Instituto Estradas de Portugal (IEP) e da Empresa Construtora Paisagens de Alcatrão (EPA), está disposto a usar de todos os meios do contencioso administrativo ao seu alcance. Posto isto, urge elaborar uma breve explanação relativa ao afastamento de dois mecanismos de contencioso administrativo nos quais a Auto-Betão eventualmente teria legitimidade activa, mas que não serão objecto da petição inicial, e justificar o seu porquê.
Assim, nos termos dos artigos 97º e seguintes do CPTA, verifica-se que a Auto Betão apenas poderia intentar um processo principal urgente se em litígio estivesse uma das seguintes situações taxativas: contencioso eleitoral; contencioso pré-contratual; intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias; intimação para a prestação de informações, consulta e passagem de certidões – o que não é o caso.
Por razões diferentes, também a acção popular é afastada. O nº2, art. 9º, CPTA, alarga a legitimidade activa, permitindo à Auto Betão agir enquanto actor popular, na defesa de um interesse da colectividade – não próprio - relativo a valores constitucionalmente protegidos (como a saúde e o ambiente). Contudo, é do conhecimento geral que uma acção popular já foi intentada pelo actor popular “Associação de Moradores de Vila Pouca de Saúde”. Deste modo, por razões estratégicas, a Auto Betão – devidamente representada pelo seu administrador e pelos seus advogados (uma vez que o patrocínio judiciário é obrigatório: 11º, nº1, CPTA) -, irá concentrar a sua defesa no direito subjectivo que lhe é próprio, através do uso - directo e indirecto - de mecanismos processuais principais e cautelares.


*

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito do Tribunal
Administrativo de Círculo de Sítio Bastante

Processo: 0016/12

AUTO BETÃO, S.A., pessoa colectiva n.º 140 106 506, com sede na Calçada da Figueira, n.º 10, de Sítio Bastante, vem respeitosamente, perante V. Exª, instaurar contra:

INSTITUTO ESTRADAS DE PORTUGAL (IEP), Instituto Público, com sede na Rua da Boaventura, n.º 33, Seixal

e

EMPRESA PAISAGENS DE ALCATRÃO, S.A., (EPA), pessoa colectiva n.º 140 106 083, com sede na Avenida da Esquizofrenia Contenciosa, n.º 30, Pedrógão Grande


- PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO IMEDIATA DAS OBRAS DA AUTO-ESTRADA A/5401, “PARA SÍTIO NENHUM”,

- ACÇÃO PRINCIPAL DE SIMPLES APRECIAÇÃO DE VALIDADE DE CONTRATO ADMINISTRATIVO,

- ACÇÃO PRINCIPAL DE IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO DE ADJUDICAÇÃO,


nos termos e com os seguintes fundamentos:


§1.
DOS FACTOS

1.º
No dia 22 de Setembro de 2009 foi celebrado um contrato público de empreitada e concessão da auto-estrada A/5401 “Para Sítio Nenhum” entre o IEP e a EPA, sem este ser submetido a forma escrita.

2.º
No dia 4 de Dezembro de 2009, o Tribunal de Contas considerou ser inválido o contrato supra referido, por vícios formais e materiais, não concedendo o respectivo visto prévio para o início da obra.

3.º
Na sentença proferida, o Tribunal de Contas invocou a razão prevista na alínea a) do n.º3 do artigo 44.º da Lei nº98/97, de 26 de Agosto, isto é, a nulidade do contrato.

4.º
O Tribunal de Contas entendeu ainda ter havido uma mudança de requisitos a meio do concurso, infundada, que veio beneficiar a EPA e prejudicar a Auto Betão.

5.º
O Tribunal de Contas entendeu, por último, não terem sido adoptadas as devidas aprovações ambientais (Declaração de Impacto Ambiental, doravante, DIA).

6.º
Não obstante, O IEP e o EPA recusaram o cumprimento da decisão do Tribunal por não ter “qualquer alcance prático, pois apenas dificulta os pagamentos, não impedindo que as obras continuem a decorrer com toda a normalidade”.

7.º
Contra a decisão proferida pelo Tribunal, as obras prosseguiram até à data.

§2.
DO DIREITO

8.º
Atribui-se aos tribunais de jurisdição administrativa a competência dos litígios que tenham por objecto a interpretação, validade e execução de contrato que estejam submetidos a um procedimento pré-contratual regulado por normas de direito público, por força da alínea e) do nº 1 do art. 4º do ETAF.

9.º
O contrato de empreitada de obras públicas – contrato oneroso através do qual um particular se encarrega de executar, ou de conceber e executar, uma obra pública (artigo 343.º, n.º1 CCP) -, juntamente com o contrato de concessão de obras públicas - por via do qual um particular se encarrega de executar, ou de conceber e executar, uma obra pública, adquirindo, como contrapartida, o direito de a explorar, eventualmente recebendo um preço (artigo 407.º, n.º1 CCP) – segundo a regra geral dos contratos administrativos (art.184º CPA), devem estar sujeitos à forma escrita.

10.º
O vício de falta de forma, previsto excepcionalmente no artigo 133º do CPA como causa de nulidade do acto administrativo, tem como consequência a nulidade do contrato – o contrato é contagiado pela patologia do acto procedimental.

11.º
Nos termos da alínea h) do nº2 do artigo 37º do CPTA, uma acção declarativa apreciativa relativa à declaração de nulidade do contrato, segue a forma de acção administrativa comum.

12.º
Simultaneamente, o acto administrativo de adjudicação é impugnável, nos termos do nº1 do artigo 51º do CPTA, pois, de acordo com a definição legal de acto administrativo presente no artigo 120º do CPA, caracteriza-se por ter eficácia externa (produz efeitos jurídicos no âmbito da relação entre a administração e particulares), e ser susceptível de afectar direitos subjectivos, isto é, de produzir lesão à posição substantiva da Empresa Auto Betão – manifestação da garantia constitucional da tutela jurisdicional efectiva, como corolário do nº4 do art. 268º da CRP.

13.º
A acção de impugnação de acto administrativo deve seguir a forma de acção administrativa especial, nos termos do artigo 46º e seguintes do CPTA.

14.º
A cumulação da acção administrativa comum com a acção administrativa especial é possível, nos termos do artigo 4º e do artigo 47º, nº2, al.a) do CPTA. Uma vez cumuladas, segue-se a forma da acção administrativa especial - artigo 5º, nº1CPTA.

15.º
O autor Empresa Auto-Betão tem legitimidade activa para intentar acção administrativa especial de impugnação de um acto administrativo, nos termos do artigo 9º, nº1 e 55º, nº1, alínea a) CPTA, uma vez que é titular do direito subjectivo à legalidade na adjudicação e titular de direitos fundamentais ao ambiente; como tem legitimidade activa para intentar acção de declaração de nulidade do contrato administrativo, nos termos do art.9º, nº1, CPTA e do art. 40º, alínea e) do CPTA, pois participou no concurso público que precedeu a celebração do contrato, podendo fazer valer a invalidade do contrato por alegada desconformidade entre o clausulado e os termos da adjudicação.

16.º
As entidades demandadas, IEP, enquanto pessoa colectiva de direito público, e a EPA, enquanto concessionária, têm legitimidade passiva plural, segundo o artigo 10º do CPTA, nº 1 e nº7 respectivamente.

17.º
Quanto à oportunidade, a nulidade pode ser atacada a todo o tempo, não está sujeita a prazo – quer na acção administrativa comum (41º, nº1, CPTA); quer na acção administrativa especial (58º, nº1, CPTA).

18.º
O autor Empresa Auto Betão tem ainda à sua disponibilidade o requerimento de uma providência cautelar, instrumental ao processo principal (113º CPTA), de forma a assegurar a utilidade da sentença a proferir em processo principal. Uma vez que, se o direito não for deste modo acautelado, isto é, o acto de concessão impugnado o quanto antes, o direito não poderá a vir ser - ou dificilmente será – acautelado posteriormente, quando a construção das obras já estiver avançada. A providência cautelar visa deste modo assegurar a tutela jurisdicional efectiva (268º, nº4, CRP), assegurar que a tutela não seja meramente formal.

19.º
Nos termos do artigo 114º, o autor pode requerer providência cautelar simultaneamente com a propositura das acções principais.

20.º
A providência cautelar adequada é a de suspensão de eficácia do acto administrativo, providência cautelar conservatória: visa manter o status quo ex ante, suspender a eficácia de um acto agressivo da Administração, isto é, impedir que a actividade administrativa ilegal produza os seus efeitos.

21.º
Verifica-se o requisito essencial à existência de uma providência cautelar: a urgência no pedido, isto é, o periculum in mora, um fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação (120º, nº1, al.b), primeira parte, CPTA).

22.º
Encontra-se preenchido o pressuposto de fumus boni iuris qualificado: o acto administrativo em causa – atendendo à sua nulidade flagrante - é manifestamente ilegal. Deste modo, o tribunal não terá que verificar o preenchimento do requisito do principio da proporcionalidade (120º, nº 1, al.a) CPTA), e a providência cautelar deve ser adoptada, uma vez que se encontram preenchidos os todos os requisitos necessários.

23.º
Caso se entenda que o fumus boni iuris não é qualificado, a providência cautelar não deve ser recusada, pois verifica-se da mesma forma o pressuposto da aparência na vertente de non fumus malus: não é manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada no processo principal (120º, nº1, al.b) segunda parte, CPTA); como também se encontra preenchido o requisito do princípio da proporcionalidade: em face dos interesses públicos e privados em conflito (120º, nº2 CPTA), após uma ponderação conforme aos princípios constitucionais, conclui-se que não existe uma situação de urgência, de periculum in mora do interesse público que justifique a recusa de providência cautelar.

24.º
Independentemente da apreciação dos fundamentos do requerimento da providência cautelar, o mero requerimento da providência cautelar determina que a Administração está proibida de executar o acto administrativo, por força do disposto no artigo 128º, nº1, CPTA. Pretende-se acautelar o periculum in mora da própria providência cautelar.

25.º
O Ministério Público, assumindo a figura de auxiliar da justiça - amicus curiae - tem legitimidade para de forma imparcial intervir em defesa de interesses públicos especialmente relevantes na acção administrativa especial iniciada por particulares, nos termos do artigo 85º do CPTA.


§3.
DO PEDIDO

26.º
Nos termos do artigo 85º do CPTA, solicita-se a intervenção do Ministério Público, enquanto figura de amicus curiae.

27.º
Pelos motivos acima descritos, pede-se ao Tribunal, na figura do Exmo. Senhor Juiz, que ordene:

- PROVIDÊNCIA CAUTELAR DE SUSPENSÃO IMEDIATA DAS OBRAS DA AUTO-ESTRADA A/5401, “PARA SÍTIO NENHUM”,
- DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO ADMINISTRATIVO,
- IMPUGNAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO


As Advogadas,

Isabel T. Duarte,
Jennifer Dutheil,
Luz Amaral Cabral,
Melissa Gonçalves