domingo, 18 de outubro de 2009

O Trauma Chinês

As informações sobre o Direito Administrativo na China de que dispus para a análise comparativa que aqui apresento, remontam aos anos 90. Pelo que pude constatar pouco se alterou desde então. Contudo, havia a esperança que a entrada no século XXI fosse a oportunidade que o Direito Administrativo chinês esperava para pôr a psicanálise em dia…

Em 1997, assistia-se em Portugal à subjectivização do modelo processual administrativo então em vigor. A passagem de modelo objectivo a subjectivo, foi concretizada com a Revisão Constitucional desse ano, na qual alterou o art. 268º nº 4 e 5, permitindo a sua nova redacção uma tutela efectiva dos direitos dos particulares.

Constituição Portuguesa: Art.268º nº 4: é garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medias cautelares adequadas.

Nesse mesmo ano, o Director do Departamento de Direito Chinês do Instituto de Estudos da Ásia Oriental da Universidade de Colónia, referia-se ao direito Administrativo Chinês como um instrumento do executivo para controlar a sociedade em processo de transformação para um Direito Administrativo que assume funções de limitação e controlo de actos administrativos.

Constituição da República Popular da China: Art 41º nº 1: os cidadãos têm o direito de criticar e apresentar sugestões a órgãos ou funcionários do Estado. Os cidadãos têm o direito de apresentar aos competentes órgãos de Estado queixas e acusações ou denúncias contra qualquer órgão ou funcionário do Estado, por violação da lei ou negligência no cumprimento dos seus deveres; mas a invenção ou distorção de facto com o objectivo de caluniar ou difamar são proibidas.

A lei de processo administrativo da República Popular da China está em vigor desde 1990. Foi a concretização de uma necessidade impulsionada pela aprovação do regime administrativo das infracções à segurança, onde as decisões administrativas interferiam ilicitamente com os direitos de personalidade e propriedade dos particulares. No entanto, a lei não reflecte ainda o Princípio da separação de poderes nem o Princípio da legalidade, uma vez que os tribunais têm poderes muito limitados e, em geral, julgar ainda é administrar…

As normas de Direito Administrativo permitem uma grande discricionariedade e incluem muito conceitos indeterminados não passíveis de controlo jurisdicional. O tribunal não pode pôr em causa a discricionariedade da Administração, o que retira grande efeito prático a este instrumento de protecção dos particulares.

Para se ter uma noção da limitação de recurso ao contencioso administrativo, o receio que as autoridades administrativas têm de ser constituídas réus faz com que evitem praticar actos administrativos definitivos, praticando sim uma “administração de negociação do preço” que consiste no compromisso que a pessoa cujo interesse está em causa, assume a não recorrer aos meios de tutela jurídica, em troca de uma punição “negociada“.

Mais um caso de muitos traumas por ultrapassar…

Bibliografia: Constituição da República Portuguesa; Constituição da República Popular da China ;Lei de Processo administrativo da República Popular da China; Conferência: “O Direito Administrativo na China: Reforma Estrutural ou Campanha?” de Robert Heuser.

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