sábado, 24 de outubro de 2009

Breve Presentazione Della Giustizia Amministrativa Italiana

Os primórdios do Contencioso italiano:

Depois da unificação italiana, com o Statuto Albertino (1848), o sistema de justiça administrativa italiano afirmou-se com um carácter monista, em que todas as causas respeitantes a direitos civis ou políticos dos particulares, em face da Administração, estavam a cargo dos tribunais judiciais. Mas estes não poderiam, em caso de ilegalidade do acto, anulá-lo ou modificá-lo – em respeito de um princípio de separação de poderes, que como já tantas vezes vimos foi distorcido. Poderia apenas conhecer os seus efeitos, desaplicá-lo se ilegal e fixar uma indemnização reparatória da lesão. Este sistema, muito criticado pela doutrina, foi revelando fraquezas à medida que a intervenção da Administração, em várias áreas da sociedade, aumentava e fazia nascer a necessidade de tutelar outras situações jurídicas: os interesses legítimos.
Para ultrapassar esta dificuldade, foi criada a IV secção do Conselho de Estado, que à data era um órgão administrativo meramente consultivo, através da Legge 13 marzo 1889, n.5992. Esta secção, pelo contrário, adquiriu definitivamente natureza jurisdicional com a Legge 7 marzo1907, n. 62. Nasce aqui o primeiro órgão da justiça administrativa, destinado como vimos à tutela das situações jurídicas, que sem dignidade de direito subjectivo, podiam ser lesadas por actos administrativos ilegais, sem contudo excluir necessariamente da sua competência matéria relativa a direitos subjectivos. Esse não foi, contudo, o entendimento da Corte de Cassazione, equivalente ao nosso Supremo Tribunal de Justiça. Em 1891, julgando um conflito de jurisdições para ele remetido pelo Conselho de Estado, a jurisprudência deste tribunal fixou uma rígida diferenciação de jurisdições dos órgãos judiciais e dos administrativos, com base na distinção entre direito subjectivo e interesse legítimo. Esta regra foi sendo temperada pela atribuição aos tribunais administrativos de competência para conhecer da violação de direitos subjectivos, em matérias, todavia, muito restritas. Nascia, assim, um sistema de contencioso dualista.



Princípio constitucional da tutela das situações jurídicas dos particulares e a constitucionalização do Contencioso Administrativo:

De capital importância no plano do contencioso administrativo não pode deixar de ser a Constituição italiana actualmente em vigor. Adoptada em 1948, no advento dos Estados Sociais da segunda metade do século XX, a Costituzione della Reppublica Italiana atribui pela primeira vez dignidade constitucional à tutela das situações jurídicas dos particulares em face da Administração, nomeadamente através dos tribunais administrativos.
Para além da garantia de tutela jurisdicional geral, prevista no artigo 24º, a norma constitucional, à semelhança da sua homónima portuguesa, prevê a tutela dos direitos e interesses legítimos dos particulares, no âmbito de relações administrativas, no artigo 113º, proibindo que o recurso aos tribunais seja excluído ou limitado a meios de impugnação específicos ou a certas categorias de actos. Permite, todavia, ao legislador ordinário reservar a competência anulatória de actos administrativos apenas a alguns órgãos jurisdicionais.


Órgãos da Justiça Administrativa:

Diferentemente da CRP, a Constituição italiana assimilou o sistema de jurisdição dualista que, com base na lei de 1889, a Corte de Cassazione tinha fixado em 1891. Nos termos do artigo 103º, é competência regra dos tribunais administrativos a resolução de conflitos resultantes da violação de interesses legítimos, podendo a legislação ordinária fixar como sua competência específica matéria referente a direitos subjectivos. Em regra, esta pertence aos tribunais judiciais.
Como órgãos da justiça administrativa, a Constituição prevê o Conselho de Estado (artigo 103º, 1º parágrafo), que mantém em simultâneo uma natureza administrativa, como órgão consultivo da Administração Pública (artigo 100º), e o Tribunal de Contas (artigo 103º, 2º parágrafo), admitindo ainda outros órgãos jurisdicionais, a desenvolver pela lei. Aos juízes destes tribunais aplicam-se as garantias dos magistrados em geral (ver em particular artigo 108º).

São, então, órgãos jurisdicionais competentes em matéria administrativa:

- Tribunais judiciais, que nos termos da Legge 20 marzo 1865, n.2248, no seu artigo 2º, têm competência apenas para julgar a violação de direitos subjectivos dos particulares. Os seus poderes resumem-se, contudo, à fixação de uma indemnização reparatória da lesão e à desaplicação do acto administrativo ilegal ao caso concreto do particular. Não têm poderes anulatórios, nem modificativos do acto. Esta limitação criou várias dificuldades levando, por exemplo, alguma jurisprudência italiana a desaplicar actos administrativos, por ela julgados ilegais, e que no entanto permaneciam em vigor no ordenamento jurídico, porque não eram anulados, e a considerar como ilícitos penais as actuações do particulares efectuadas ao seu abrigo. As acções propostas nestes tribunais seguem as formas previstas no Código de Processo Civil.

- Tribunais administrativos
São eles, os Tribunais Administrativos Regionais (TAR), previstos na Legge 6 dicembre 1971, n.1034, e o Conselho de Estado, actualmente regulado pelo T.U. de 6 giugno 1924, n.1054. Como já atrás foi aflorado, estes tribunais têm duas espécies essenciais de competência: competência geral, no que respeita a actos administrativos ilegais, feridos dos vícios típicos (incompetência, excesso de poder e violação de lei) e lesivos de interesses legítimos e interesses difusos. O juiz administrativo tem aqui apenas poderes anulatórios, fixando-se o princípio da não reparação das lesões destas situações jurídicas. E competência exclusiva, quando a lei remete para a sua jurisdição o tratamento de violações de direitos subjectivos, alargando os seus poderes, que para além de anulatórios são também condenatórios (por exemplo em matéria relativa à função pública).
Em regra, o Conselho de Estado funciona como instância de recurso das decisões dos TAR’s.

Ao lado destes, temos ainda o Tribunal de Contas, responsável pela fiscalização das contas públicas e competente para dirimir conflitos referentes a algumas prestações sociais, e os tribunais das águas públicas.


A reforma do contencioso: um novo sistema monista

Este sistema dualista levantou, ao longo do tempo, muitos problemas, não só na determinação do tribunal competente, mas sobretudo porque se manifestava cada vez mais desadequado a tutelar convenientemente a situação dos particulares, obrigando-os, muitas vezes, a recorrer às duas jurisdições, primeiro para conseguir a anulação do acto e depois uma indemnização.
Daí que, em 2000, depois de uma tentativa em 1998 que veio a ser declarada inconstitucional por vícios orgânicos, o legislador italiano, sob influência das exigências do direito comunitário e já alerta para estas dificuldades, operasse uma grande reforma neste sistema. Mudança essa que alguma doutrina italiana não deixou de assinalar como uma verdadeira alteração de paradigma.
Vejamos. Fixa a Legge 21 luglio 2000, n.205, que passam a ser da competência dos tribunais administrativos todas as matérias referentes aos procedimentos de adjudicação de obras públicas, serviços e fornecimento, e referentes a serviços públicos, como os transportes ou as telecomunicações, entre outros. Revoga ainda todas as disposições que nestas áreas obrigavam o particular a recorrer aos tribunais judiciais para obter uma indemnização.
O amplo alcance destas matérias e a própria fixação da jurisdição, já não em função da natureza da situação jurídica alegada pelo particular, mas em razão da matéria, permitem hoje afirmar que a dualidade de jurisdições quase se apagou do ordenamento jurídico italiano. Os tribunais administrativos adquirem competência e plena jurisdição na maioria dos litígios administrativos, podendo anular qualquer acto administrativo e fixar uma indemnização. Torna-se irrelevante tratar-se ou não de um direito subjectivo ou interesse legítimo, fixando-se como princípio a reparação em caso de lesão de ambos.
Nos tribunais administrativos, o meio processual previsto mantém ainda o nome “traumático” de recurso, que agora compreenderá poderes de mera apreciação, condenação e anulação, não autonomizando o legislador os três tipos diferentes de acção. As formas de processo utilizadas são a especial, ordinária e sumária, cada vez mais próximas do processo civil. Estão previstos ainda uma acção executiva e procedimentos cautelares, antes denominados incidentes de suspensão da eficácia do acto administrativo e integrados no processo principal, e que com a reforma de 2000 se tornaram acções autónomas.



Bibliografia:
- SILVA, Vasco Pereira da. “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo”, Almedina, 2ª edição, 2009
- MARTINS, Ana Gouveia. “Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo”, Coimbra Editora, 2005.
- SATTA, Filippo. “Giustizia Amministrativa”, CEDAM Ed., 3ª edição, 1997.
- ITALIA, Vittorio. “La Giustizia Amministrativa” - Commento alla Legge 21 luglio 2000, n.205”, Giuffrè Editore, 2000.

- Costituzione della Reppublica Italiana

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